Uma pesquisa recente lançada pela Ordem dos Advogados do Brasil no Rio de Janeiro (OAB-RJ) revelou um cenário preocupante: a ampla maioria das advogadas que sofrem violência física ou psicológica em seu cotidiano opta por não denunciar seus agressores. O levantamento, intitulado “Ser Advogada Não me Salva”, contou com a participação de quase mil profissionais do Direito, expondo a dimensão da violência contra advogadas e a subnotificação desses casos. Os dados são alarmantes, indicando que 67,7% das vítimas mantêm o silêncio, um número que ressalta a urgência de ações e debates sobre a segurança e o bem-estar dessas profissionais. A pesquisa joga luz sobre as barreiras que impedem a denúncia e a necessidade de um suporte mais eficaz para enfrentar este grave problema social.
A face oculta da violência: dados alarmantes
A pesquisa “Ser Advogada Não me Salva” abriu um canal para que profissionais do Direito pudessem compartilhar suas experiências, revelando uma realidade sombria para muitas. Dos 989 participantes voluntários, 78,6% declararam já ter sido vítimas de algum tipo de violência, um percentual que aponta para a ubiquidade do problema dentro e fora do ambiente profissional. O dado mais impactante, contudo, reside na taxa de subnotificação: mais de dois terços das advogadas agredidas – precisamente 67,7% – não procuraram as autoridades ou canais de denúncia, preferindo lidar com a situação em silêncio. Esta relutância em denunciar sugere um complexo emaranhado de fatores, que podem incluir o medo de represálias, a vergonha, a dependência econômica ou até mesmo a descrença na eficácia do sistema de justiça, mesmo para aquelas que o representam.
A prevalência da violência psicológica
Entre os diversos tipos de agressão reportados, a violência psicológica destacou-se como a forma mais recorrente, atingindo impressionantes 85,3% das vítimas. Esta categoria de violência, muitas vezes insidiosa e difícil de ser identificada ou comprovada, manifesta-se por meio de ameaças, humilhações, manipulação, controle excessivo, isolamento social, e desvalorização. Seus efeitos podem ser devastadores, minando a autoestima, a saúde mental e a capacidade profissional das vítimas. A alta prevalência da violência psicológica sublinha a necessidade de ampliar a conscientização sobre suas formas e impactos, e de oferecer suporte especializado para que as advogadas possam reconhecer e reagir a esses abusos, que nem sempre deixam marcas físicas visíveis, mas causam danos profundos e duradouros.
Perfil das vítimas e agressores
O levantamento também traçou um perfil tanto das advogadas vítimas quanto de seus agressores, oferecendo insights cruciais para a formulação de estratégias de combate. A vasta maioria das participantes (97,1%) se declarou mulher cisgênero, indicando um foco claro da pesquisa. As faixas etárias mais atingidas pela violência foram as de 35 a 45 anos (36,5%) e 25 a 35 anos (23,5%), ou seja, profissionais em pleno desenvolvimento de suas carreiras, muitas vezes construindo família e consolidando sua posição no mercado de trabalho. Quanto aos agressores, os resultados revelaram que a violência não se restringe apenas ao ambiente doméstico, mas também se estende ao âmbito profissional. Parceiros ou ex-parceiros foram apontados como os principais agressores (37,9%), seguido por colegas de profissão (17,2%). Esse dado é particularmente alarmante, pois expõe as advogadas à violência em múltiplas esferas de suas vidas, exigindo uma abordagem multifacetada para a proteção e o amparo. Além disso, quase metade das advogadas (49,7%) reside na capital fluminense, o que pode influenciar a dinâmica das denúncias e o acesso a redes de apoio.
Impacto e ações em resposta
A divulgação desses resultados não apenas escancara uma realidade dolorosa, mas também impulsiona a OAB-RJ a reforçar seu compromisso com a causa. A pesquisa serve como um catalisador para a criação de políticas mais robustas e para a ampliação da rede de apoio às advogadas. A liderança da instituição tem enfatizado a urgência de uma resposta coordenada para enfrentar esse desafio que transcende as barreiras da profissão, ecoando em toda a sociedade. A compreensão detalhada dos tipos de violência, perfis de vítimas e agressores é fundamental para direcionar os esforços de prevenção, proteção e punição, garantindo que as profissionais do Direito possam exercer sua função em um ambiente seguro e livre de discriminação.
A voz da liderança da OAB-RJ
A presidente da OAB-RJ, Ana Tereza Basilio, manifestou sua preocupação com os resultados e a situação geral no estado. Ela destacou que o Rio de Janeiro ainda ocupa o segundo lugar no país em casos de violência contra a mulher, um dado que reforça a gravidade e a abrangência do problema. Em suas palavras, “É urgente que o poder público priorize o enfrentamento deste sério problema social e nós, como ponte com a população, vamos lutar por isso.” A declaração da presidente da OAB-RJ não apenas sublinha a necessidade de intervenção estatal, mas também reafirma o papel da instituição como uma voz ativa na defesa dos direitos das mulheres, buscando catalisar mudanças significativas na legislação e nas práticas de combate à violência.
Próximos passos e o papel da ouvidoria
Diante dos primeiros e impactantes resultados da pesquisa, a Ouvidoria da Mulher da OAB-RJ já está trabalhando na próxima fase do projeto. Um novo levantamento está em andamento para identificar e estabelecer contato com cerca de 500 advogadas que expressaram o desejo de conversar mais detalhadamente com a equipe. Segundo Andréa Tinoco, ouvidora da Mulher da OAB-RJ, o principal objetivo dessa escuta ativa é oferecer apoio direto, estruturar políticas internas abrangentes de prevenção, orientação e conscientização. A meta é clara: criar um ambiente profissional mais seguro, acolhedor e equitativo para todas as advogadas. Tinoco enfatizou o compromisso da ouvidoria em “transformar esses números em políticas que garantam um exercício profissional livre de qualquer forma de violência e discriminação”, destacando que a escuta ativa das advogadas será o eixo central dessa construção de um futuro mais justo e seguro.
Conclusão
Os dados levantados pela OAB-RJ são um alerta contundente sobre a prevalência da violência contra advogadas e a alarmante taxa de subnotificação que permeia a realidade dessas profissionais no Rio de Janeiro. A pesquisa “Ser Advogada Não me Salva” não apenas quantifica o problema, mas também humaniza a urgência, revelando que a violência psicológica é predominante e que os agressores podem vir tanto do círculo íntimo quanto do ambiente de trabalho. A resposta da OAB-RJ, liderada pela Ouvidoria da Mulher, é um passo fundamental para transformar esses números em ações concretas de apoio, prevenção e conscientização. É imperativo que a sociedade e o poder público reconheçam a seriedade da questão e colaborem para construir um futuro onde todas as mulheres, incluindo as advogadas, possam exercer suas profissões com dignidade e segurança, livres de qualquer forma de violência.
FAQ
Qual foi o principal achado da pesquisa da OAB-RJ sobre a violência contra advogadas?
A pesquisa revelou que 67,7% das advogadas vítimas de violência física ou psicológica não denunciaram seus agressores, indicando uma alta taxa de subnotificação do problema.
Qual tipo de violência foi mais comum entre as advogadas pesquisadas?
A violência psicológica foi o tipo mais recorrente, afetando 85,3% das vítimas que participaram do levantamento.
Quem são os principais agressores apontados pelas vítimas na pesquisa?
Os principais agressores foram parceiros ou ex-parceiros (37,9%) e colegas de profissão (17,2%), demonstrando que a violência ocorre tanto no âmbito doméstico quanto no profissional.
Quais ações estão sendo tomadas pela OAB-RJ em resposta aos resultados da pesquisa?
A OAB-RJ, por meio da Ouvidoria da Mulher, está realizando um levantamento para contatar advogadas que aceitaram conversar, com o objetivo de oferecer apoio, estruturar políticas internas de prevenção, orientação e conscientização, e criar um ambiente mais seguro e acolhedor.
Se você é uma advogada e precisa de apoio ou informações, não hesite em procurar os canais de ajuda da OAB-RJ e de outras instituições de acolhimento. A sua voz é fundamental para a construção de um ambiente profissional e social mais seguro para todas.
Fonte: https://oglobo.globo.com